Propagação pela E Esporádica
Continuamos a nossa série de artigos, que poderíamos até intitular de “Entenda como Funciona”. Até agora já tentamos explicar como funciona a TEP (propagação troposférica), a propagação por meteoros e a Tropo (propagação troposférica). Desta vez, vamos falar de uma modalidade um pouco mais rara de propagação na banda de FM: a propagação por E Esporádica, ou simplesmente “Es” (Es), mais um dos mecanismos responsáveis pela recepção de emissoras a muito longa distância tanto na banda de FM quanto em TV.
Primeiramente, por que esse nome curioso? O nome E Esporádica está diretamente relacionado com a camada E da nossa velha conhecida ionosfera. Mas, calma lá… a camada E não reflete apenas sinais de emissoras de ondas curtas? A resposta é NEM SEMPRE. A camada E, assim como a camada superior, que é dividida em F1 e F2, é pau pra toda obra. Localizada a uma altura de 90 km e indo até os 140 km mais ou menos, a camada E reflete os sinais de algumas freqüências de ondas curtas durante o dia; neste horário ela se encontra com um nível de ionização (formação de íons e elétrons livres na ionosfera devido à radiação solar) bastante grande, uma vez que sofre uma incidência maior dos raios solares.
O Sol ioniza essa camada durante o ano todo e o dia inteiro. Logo, a conclusão a que se chega é que durante a noite, por não haver mais atividade solar, a camada E desaparece quase que por completo, ou pelo menos é bastante diminuída. Por vezes, entre os 90 e 140 km da camada E pode se formar uma outra camada com alto nível de ionização, a chamada E esporádica, que leva esse nome justamente por nem sempre aparecer. É difícil prever onde, quando ocorrerá e quanto tempo ela vai durar, mas percebe-se que isso costuma acontecer com maior freqüência no verão. Muito bem, até aqui fornecemos a vocês algumas informações mais do que cientificamente comprovadas. Agora vamos partir para o campo da especulação.
Prováveis causas da E esporádica
Assim como acontece na camada F da ionosfera, a mais “próxima” do Sol, algumas zonas de ionização fortemente concentradas são produzidas na camada E. Isso parece ser um processo que ocorre durante o dia todo e o ano inteiro e é especialmente creditado às explosões que acontecem na superfície do Sol. Em outras palavras, as explosões solares parecem ter o efeito de criar zonas bastante irregulares de ionização na camada E. Vamos chamar essas zonas de manchas ou, melhor ainda, de “nuvens”. Há ainda os que acreditam que quanto mais perpendiculares são os raios solares que incidem sobre a ionosfera, maiores serão as probabilidades de aparição da camada E esporádica.
Bem, mas como afirmei, toda essa explicação não passa ainda de especulação, pois a causa exata da formação de nuvens esporádicas na camada E não é conhecida precisamente. Nem mesmo os estudiosos têm uma opinião única a respeito do fenômeno. Para se ter uma idéia, não há nem mesmo como afirmar com toda certeza que existe correlação entre o surgimento das nuvens esporádicas e os ciclos solares (aqueles de 11 anos, que influenciam desde a recepção em ondas curtas à recepção de sinais de FM pela TEP). Da mesma forma, a sua ocorrência não pode ser prevista com precisão. Uma das poucas coisas de que se tem certeza é de que a formação das nuvens esporádicas guarda relação com a latitude da Terra. O caso mais conhecido é o das latitudes mais ao norte do planeta (Pólo Norte), onde ela tem ligação com a chamada Aurora Boreal.
Mecanismos de propagação na camada E esporádica
A principal vantagem dessas nuvens esporádicas de ionização para nós dexistas da banda de FM é, claro, os efeitos que elas causam na recepção de FM. Normalmente a camada E é transparente para os sinais de VHF (FM, por exemplo), mas quando tais sinais encontram as nuvens ionizadas podem sofrer reflexão – da mesma forma que ocorre com os sinais das emissoras de ondas curtas durante o dia. Existem basicamente dois mecanismos diferentes que permitem a recepção em VHF.
1. Reflexão simples através de uma única nuvem
Esse tipo de reflexão é parecido com o que ocorre com as emissoras de ondas curtas, onde um sinal parte de uma estação, alcança a parte ionizada e é refletida para baixo até chegar ao receptor, há milhares de quilômetros de distância. A diferença é que em VHF as distâncias percorridas pelo sinal refletido são menores, chegando a atingir 2000 km dependendo da altura em que se encontra a nuvem ionizada. Além disso, para ser recebido, a nuvem de ionização deve estar exatamente a meio caminho entre a estação transmissora e você. Para complicar, por vezes a região ionizada permanece imóvel, mas pode ser que ela se mova quase que em linha reta a grandes velocidades, trazendo consigo estações diferentes, umas atrás das outras e, como é de se esperar, muita interferência.
Os sinais recebidos são geralmente muito fortes, podendo encobrir facilmente aquele de estações da sua localidade. Porém, a coisa toda dura pouco tempo, nem tanto devido ao enfraquecimento ou desaparição da ionização, mas ao movimento das nuvens, que faz com que ocorra um rápido desalinhamento entre elas, a(s) estação(ões) transmissora(as) e você. No momento em que você começa a se divertir, eis que tudo desaparece. E, pode ter certeza, meu caro, de que raramente as mesmas condições de propagação voltarão a ocorrer no mesmo dia. Troque de banda ou desligue o rádio para não ficar mais frustrado! Acabou mesmo o que era doce!
Como a Tropo (propagação troposférica), a propagação pela E esporádica pode ocorrer em qualquer dia do ano e é mais notada ao finalzinho da tarde, começo da noite, principalmente no verão.
2. Reflexão nuvem a nuvem
Ocorre quando existem duas nuvens ionizadas localizadas entre a(s) estação(ões) e o local de recepção. È um tipo mais raro (mas não impossível) de ocorrer, pois para tal as duas nuvens, a estação transmissora e você têm de estar todos alinhados. Outras razões ainda fazem com que as freqüências recebidas raramente atinjam o canal 6 da TV e passem dos 88 MHz.
Na minha trajetória de dexista estou certo de ter experimentado o poder da E esporádica pelo menos uma vez. Foi a única vez que consegui captar FMs uruguaias na região noroeste do Paraná. A coisa toda durou menos de 20 minutos. Como as emissoras chegavam umas atrás das outras, desvanecendo a cada dois ou três minutos, escutei muita coisa, mas identifiquei apenas três ou quatro estações. Talvez a recepção por E esporádica também possa explicar a recepção de emissoras peruanas em Santa Catarina, relatada anos atrás no boletim.
Apesar de as recepções pela E esporádica serem um pouco mais raras do que as que ocorrem através da Tropo ou da TEP, elas não deixam de ser extremamente interessantes e desafiadoras. Talvez seja por esse fato que elas vêm chamando tanto a atenção de dexistas e radioamadores ao longo das décadas.
Um grande 73 a todos e mantenham ouvidos atentos!
PARA SABER MAIS
www.amfmdx.net/propagation/Es.html
http://www.813am.qsl.br/madlinks/propaghf/propag.html
www.anarc.org/wtfda/propagation.htm
www.radioamadores.net/propagacao.htm
Por Marcelo Xavier Vieira
* Artigo originalmente publicado no boletim Atividade DX
Parabéns pelo artigo publicado na minha infancia tive ess experiência maravilhosa de propagação em Campo Mourão no interior do Paraná em ouvir emissoras do Rio de Janeiro e Salvador e em Curitiba ouvir emissora de São Paulo